“Se eu puder poupar uma vida de um acidente como o da Mari, já foi muito.” Foi com essa frase que Adriana Espírito Santo, mãe da menina que inspirou a Lei Marina Fallavena, resumiu um movimento que nasceu da dor. Hoje essa ação é uma força transformadora, que luta por mais segurança nas quadras esportivas, escolas e condomínios de todo o Brasil.

A Lei Marina Fallavena, ou Lei nº 13.438/2023, sancionada em 4 de maio de 2023, em Porto Alegre, determina que nenhuma goleira em espaços públicos ou privados pode permanecer solta. Agora deve possuir, no mínimo, dois pontos de fixação e passar por vistorias iniciais e periódicas.
Aos 11 anos Marina perdeu a vida em um acidente evitável, causado pela queda de uma goleira mal fixada. E hoje, o que poderia ter sido apenas mais um caso, virou mobilização, política pública e legado.
A Lei Marina Fallavena transformou a dor em ação
Ao perder sua filha, Adriana, que atua como médica pediatra, iniciou uma grande investigação para entender se aquele tipo de acidente era algo isolado. “Fui estudar o assunto. E aí eu descobri que na Europa e nos Estados Unidos já existem leis pra isso há bastante tempo”, conta.
Ela também comentou que em Portugal, no final dos anos 90, ao avaliarem o motivo da perda de tantas crianças, concluiu-se que muitos acidentes estavam acontecendo: “Eles viram que as crianças morriam brincando, passeando, fazendo esporte… crianças saudáveis”.
Segundo ela, no Brasil, a principal causa de morte de crianças entre 1 e 14 anos não são doenças, mas acidentes. Afinal, aqui não existe uma preocupação clara com a segurança de estruturas em ambientes infantis. “Então eu comecei a ver que tínhamos urgência de trazer isso pra cá. Falamos com pessoas da política, acessíveis, para se juntar ao projeto”, relembra.
Com o apoio de vereadores, a lei foi aprovada em tempo recorde: apenas quatro meses.
Da legislação municipal ao impacto nacional
Além de Porto Alegre, a Lei Marina Fallavena já chegou a municípios como Pelotas, Santa Maria, Torres e São Sepé, por exemplo. Com uma versão estadual já em andamento, o objetivo agora é conquistar uma legislação federal, “para que quando tenham obras, já esteja adequado”, explica Adriana.
Mais do que a exigência de fixação de goleiras, a lei propõe um novo olhar sobre a segurança dos ambientes de lazer e esporte. “Quando tu estabelece uma medida de segurança direcionada para goleira, na verdade tu está melhorando a segurança daquele ambiente como um todo. Porque existem vários acidentes que podem ocorrer na área de lazer e nas quadras poliesportivas, independente da supervisão dos pais. O acidente pode acontecer com os pais ali, e eles não podem fazer nada.”
Condomínios como aliados na prevenção
Dentro dos condomínios, a mãe de Marina considera que “os moradores precisam tomar pra si, como cidadãos, a consciência de fiscalizar. Mas, pra isso, as pessoas precisam saber. Eu, por exemplo, não sabia que precisava ver se a estrutura da goleira estava presa. Então a gente tenta divulgar isso, para que as pessoas desçam em seu condomínio para revisar, fiscalizar. Se os moradores levarem para os síndicos, que, em parceria com a administradora do condomínio, podem revisar e fazer os consertos, aí essa força, essas pessoas unidas, vão encontrar soluções fáceis.”
Cuidados indispensáveis para espaços infantis
Adriana defende que os condomínios adotem boas práticas de manutenção, com revisão periódica de todos os equipamentos das áreas comuns.
Ela sugere: “Deveriam haver atas com recomendações, com revisões para manutenções. Poderia ter um prazo de, a cada 3 meses, revisar tudo. Porque às vezes um parafuso pode soltar, ou a madeira soltar, e temos casos em que isso causou óbito.”
Ela também comenta a substituição de materiais pesados por mais leves nas goleiras, como o aço carbonizado. Além disso, cita o Pontal, administrado pela Imóveis Crédito Real, como um exemplo que prioriza a segurança, e não só a estética da estrutura: “Temos exemplos na cidade (Porto Alegre), como a pracinha do Pontal. Ela já tem o piso adequado, que é um piso fofo, caso as crianças se machuquem. A altura dos brinquedos já é adequada.”
A cultura da segurança ainda precisa ser construída
Ao longo da entrevista, Adriana volta diversas vezes ao conceito de “cultura de segurança”, algo já enraizado em outros países, mas ainda em construção no Brasil.
A respeito disso, ela compartilha que, em alguns países da Europa, a piscina de qualquer prédio deve ter, obrigatoriamente, uma área de delimitação, evitando o acesso das crianças. Para ela, essa é mais uma medida que tem urgência de incorporar à cultura brasileira.
Parcerias com faculdades de Educação Física e Pedagogia também estão nos planos da mãe da menina que deu nome à Lei Marina Fallavena. Além disso, campanhas que ampliem esse assunto, com a participação ativa das empresas de administração condominial e envolvimento dos próprios moradores, são ações que ela considera urgentes.
“Ao poder público, cabe fiscalizar e divulgar, se for o caso, a lei e o período em que o clube, escola… terão para fazer os ajustes necessários.” Em relação à comunidade, ela diz: “É um trabalho de formiguinha, de ir divulgando, para que as pessoas cobrem. O trabalho de fiscalização da comunidade é muito importante”.

A Lei Marina Fallavena é um legado para a comunidade
Ao comentar sobre como essa luta tem ajudado no processo de ressignificação da perda, Adriana se emociona: “A perda da Marina não foi em vão. Com 11 anos ela vai deixar mais legado do que muita gente com 80 anos. No início foi até um grito de socorro, pra mim mesma. Ao longo do tempo, eu vi que é uma coisa bonita que ela vai deixar. Ela era apaixonada por criança, e essa lei é a cara dela.”
Entre parcerias com empresas, novas legislações em curso e escolas já adaptadas em Pelotas, Santa Maria, Torres e São Sepé, por exemplo, municípios que adotaram a Lei Marina Fallavena, o movimento liderado por Adriana cresce a cada dia. Mas, para ela, o mais importante é a conscientização: “Não adianta ser colorido e bonito, precisa ser seguro. Vamos olhar para esses espaços com um olhar voltado para a segurança. Se a gente conseguir fazer com que as pessoas, ao chegarem em um ambiente desses, consigam visualizar isso de aumentar a segurança, já é um grande passo.”
Como você pode ajudar?
A Lei Marina Fallavena é um convite à ação. Então você, como morador, síndico, administrador ou pai e mãe, pode:
- Observar se as estruturas das quadras e brinquedos do seu condomínio estão seguras
- Denunciar irregularidades à prefeitura (como fez uma moradora de Porto Alegre, que ligou para o 156 e teve resposta imediata)
- Participar de reuniões condominiais e propor revisões periódicas das áreas de lazer
- Disseminar informações, defendendo a importância de ambientes seguros para as crianças
Uma responsabilidade de todos
A segurança dos espaços não é só uma atribuição legal, mas uma construção coletiva que merece o olhar minucioso de cada um, independentemente de ter ou não ter crianças sob responsabilidade.
Na CR, acreditamos que é possível viver melhor quando unimos bem-estar, conforto e cuidado com a vida de quem compartilha a rua, o bairro ou a cidade com a gente.
Pense na segurança dos ambientes onde as crianças brincam. Isso é o mínimo que podemos fazer por elas.
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